O Ministério Público (MP) apresentou em dezembro passado uma petição no Supremo Tribunal Administrativo (STA) para “a declaração de nulidade e anulação de diversos atos administrativos” relacionados com obras de modificação e ampliação no atual aeroporto de Lisboa (Humberto Delgado).
A notícia da ação interposta pelo MP a 12 de dezembro junto do STA foi avançada nesta quinta-feira, dia 9 de janeiro, pelo ‘Jornal de Negócios’ e confirmada à agência portuguesa de notícias ‘Lusa’ pelo STA, que esclareceu que o processo se encontra neste tribunal em fase de citação, ou seja, a fase em que “se dá conhecimento às entidades demandadas e aos contrainteressados de que contra eles foi proposta uma determinada ação, e que são chamados ao processo para dentro do prazo legal, se defenderem e pronunciarem”.
Segundo os esclarecimentos deste tribunal à ‘Lusa’, segue-se a fase de apresentação de contestações, não tendo sido apresentada qualquer providência cautelar neste âmbito.
A ação do MP pretende que seja declarada nula a decisão da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), de 22 de janeiro de 2024, que dispensou da obrigatoriedade de avaliação de impacte ambiental (AIA) as obras previstas para o Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, assim como as deliberações do Conselho de Ministros de 28 de dezembro de 2023, que obrigavam a ANA – Aeroportos de Portugal, a realizar obras e investimentos naquela infraestrutura.
O MP quer ainda ver anulada a resolução de Conselho de Ministros de maio de 2024, já da responsabilidade do atual Governo, que “prevê medidas para reforçar a capacidade do Aeroporto Humberto Delgado”, assim como os pareceres favoráveis da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC).
“O MP pede ainda que a ANA Aeroportos de Portugal S. A. seja condenada à abstenção de comportamento, qual seja, a de execução de projetos de modificação e ampliação do Aeroporto Humberto Delgado (AHD) com impacte significativo no ambiente não precedidos de avaliação de impacte ambiental”, adianta ainda o STA.
O MP especifica, refere a nota do STA, que em causa estão “todos os projetos mencionados na Resolução de Conselho de Ministros n.º 201/2023 e ainda outros que integrem o seu plano de desenvolvimento, ou o seu plano de melhoria operacional ou o seu plano diretor para o Aeroporto Humberto Delgado, salvaguardas as intervenções de mera manutenção, ou de força maior por razões de segurança”.
Em resposta à ‘Lusa’, a Procuradoria-Geral da República (PGR) confirmou a entrega da ação administrativa no STA a 12 de dezembro que “visa essencialmente o cumprimento do regime jurídico de avaliação de impacte ambiental no respeitante às obras a realizar no Aeroporto Humberto Delgado previstas”.
“A ação administrativa do MP considera que a avaliação de impacte ambiental deve incidir sobre a totalidade dos projetos decididos – e não somente os que se referem na Resolução do Conselho de Ministros n.º 67/2024 – levando, outrossim, em conta, que a última e única avaliação de impacte ambiental data de 2006, sob pena de, assim não se fazendo, ocorrer fracionamento de avaliação de impactes”, referiu a PGR na resposta à ‘Lusa’.
Na ação interposta pelo MP, a que a ‘Lusa’ teve acesso, recorda-se as obras feitas para dar resposta a um acréscimo de tráfego aeroportuário, mas argumenta-se que “o problema não é realizarem-se obras”, mas sim “realizarem-se obras significativas de resposta a esse acréscimo sem avaliação de impacte ambiental”.
“Salvo o devido respeito por quem assim não entende, a avaliação de impacte ambiental é preterida porque, contrariamente ao sucedido em 2006, o planeamento de 2013-2018 não foi submetido a avaliação em termos requisitados pelo Direito da União Europeia, porque os projetos, na sua ponderação de viabilização ambiental, são reiteradamente perspetivados de modo fracionado e porque se erra na aplicação do regime jurídico”, lê-se na argumentação do MP.
Sobre as obras previstas de construção de um novo terminal (PIER SUL), da plataforma de estacionamento de aviões e de remodelação de um terminal, o MP entende que “seria suficiente para considerar a verificação de impactes significativos no ambiente”.
“Mas além disso, ocorre fracionamento de projetos, havendo a considerar obras a montante (tudo o que se fez sem AIA; e em conexão com as obras atuais, o encerramento da pista 17/35), obras concomitantes (as OED [Obrigações Específicas de Desenvolvimento] atrasadas e a extensão do aeroporto para a área militar) e obras a jusante (tudo o que virá a seguir para fazer face a 45 milhões de passageiros)”, lê-se na ação do MP.
Perante isto, o MP defende que “cabe exigir a realização de AIA neste momento, e não apenas mais tarde”.
As obras no Aeroporto Humberto Delgado, adjudicadas ao consórcio da Mota-Engil e da Vinci, preveem um investimento de mais de 233 milhões de euros e visam mitigar o atual congestionamento da infraestrutura até ao arranque do novo aeroporto Luís de Camões, em Alcochete.
O Governo Português já anunciou que vai apresentar uma contestação à ação administrativa avançada pelo MP e a ANA lamenta a tentativa de impedir obras no aeroporto.