Quarenta mil HPs submarinos

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E as minhas férias chegaram ao fim, e como vocês já tinham percebido no artigo anterior, elas foram especialmente voltadas ao mar: desde meu último voo tripulando, dia 25 de janeiro, até meu primeiro após as férias, serão 36 dias inteiros sem pilotar. Em compensação, navegamos muito. Após aprender o básico no pequeno Dingue, de 12 pés, fomos para o Marbe, de 24 pés, aprender a velejar distâncias maiores. Durante semanas, apaixonei-me pela vela – a mesma ciência que permitiu que falemos todos português – e aprendi e me diverti muito, num contato com a natureza que gostei muito de ter. Mas, na última semana das férias, conseguimos levar a navegação a um outro patamar. Como queríamos há anos, juntamos boa parte de nossa família e partimos num cruzeiro!

Escolhido pela data e pelo itinerário, um cruzeiro para o Rio da Prata pouco antes do Carnaval, fomos parar num dos principais navios de passageiros da Mediterranean Shipping Company, o MSC Musica. A empresa, nascida na Itália, é o maior operador privado de navios cargueiros do mundo, e sua divisão de cruzeiros está entre as principais do ramo. Embarcamos em Santos, o principal porto brasileiro, de onde zarpamos para 40 horas de navegação até a bela Punta del Este, no Uruguay, único trecho do itinerário que eu não conhecia – e que gostei demais. Apesar do pouco tempo que ficamos em Punta, incluindo a clássica visita à Casapueblo e à mão da Praia Brava, foi uma boa surpresa. De lá, foi uma noite navegando até Buenos Aires, porto no qual permanecemos por mais de um dia antes de sairmos numa bela tarde para Montevideo, onde chegamos na manhã seguinte – a navegação dentro do Rio da Prata é lenta, pois é feita em grande parte em canais especialmente dragados, e vim a saber depois, de forma manual. Após uma manhã em Montevideo – onde nem desci do navio – voltamos a todo vapor – ou diesel – ou energia – para Santos, onde chegamos 44 horas depois.

Esse foi meu segundo cruzeiro, o outro havia sido dez anos antes em um navio menor, da Pullmantur, para o paradisíaco arquipélago de Fernando de Noronha. Além de todas as benesses óbvias de um cruzeiro, esse se destacou pelas várias oportunidades em que pudemos aprender sobre o navio em si, a navegação marítima, e tirar dúvidas diretamente com o comandante e os oficiais. A primeira curiosidade: no mar pode-se navegar mais ou menos para onde se queira: ainda que haja um equivalente ao plano de voo, o navio segue a rota que for inserida no seu computador, e os desvios necessários são feitos durante a viagem, sem a coordenação de orgão de controle, como os aviões, apenas baseado nas regras do mar – semelhante a aérea, em que duas embarcações em sentido contrário, desviam-se para a direita. Mas há lugares onde há corredores controlados específicos. Dentro do Rio da Prata, por exemplo, há canais com dezenas de quilômetros de extensão. Embora o rio seja bastante largo – mais de duzentos quilômetros de largura em alguns pontos – estes canais estreitos garantem que o navio não encalhe, e a passagem em determinados trechos obedece a estimados, pois o canal é de mão dupla e nem todos os trechos comportam dois navios grandes. O calado do MSC Musica, de 8 metros, por vezes deixava apenas 2 metros de margem para o fundo do rio. Incrível, não? Com 964 pés, ou 293 metros de comprimento, o Musica pode levar mais de 2700 passageiros, e quase mil tripulantes – o que o coloca entre os 40 maiores navios de cruzeiro do mundo. Navios tem o equivalente marítimo de transponders, mas pouco falam entre si – na maior parte das vezes o desvio é feito visualmente. Seu radar também acusa o formato da costa e tempestades, além de um sonar que mostra profundidades e das cartas, consultadas manualmente em papel ou através de um moving map ligado ao GPS, exatamente como num avião. Sua velocidade máxima é de 23 nós, e uma outra curiosidade: a temperatura da água influi na performance: quando a água é mais fria, é possível usar o máximo de potência, pois a própria água resfria o motor. Por isso, nessa viagem em águas quentes, mantivemos cerca de 20 nós em todo o trecho de mar aberto.

E curiosamente, diferentemente do que muita gente pensa, o navio não é movido por um motor a diesel. Seus quatro motores – dois de popa e dois de proa – são elétricos – de forma a serem mais leves, eficientes e silenciosos. Os cinco geradores de eletricidade – com capacidade para abastecer uma cidade de 120 mil habitantes – estes sim são movidos a diesel, e nessa viagem de uma semana consumiram 800 metros cúbicos do combustível. Os motores de popa, aliás – após uma série de conversões de unidades de potência – têm surpreendentemente força similar a dos motores de um Boeing 737NG. Claro, o 737 pesa mais de mil vezes menos – o MSC Musica tem 90 mil toneladas – e voa mais de 20 vezes mais rápido. De qualquer forma, não deixa de ser intrigante.

Foto: A bordo do MSC Musica, o belíssimo poente sobre o Rio da Prata, no través de La Plata, Argentina, exatamente sob a rota que voarei no meu primeiro voo após as férias, na saída de Ezeiza.  


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