Boas Festas, Bons Voos

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Como todo mundo sabe, quanto mais os terráqueos passeiam, mais os tripulantes trabalham. E o fim de ano não é diferente, então, é um desafio e tanto para as companhias gerenciarem escalas apertadas e o desejo dos tripulantes de passarem as festas com suas famílias. Cada operador faz de um jeito, mas em geral, os tripulantes podem escolher algumas coisas, que são então alocadas de acordo com sua senioridade na função. Por exemplo: se dois chefes de cabine pediram Natal numa determinada cidade, mas só há um pernoite, a tendência é que o chefe promovido há mais tempo fique com o que pediu. Dito isso, farei um breve apanhado dos meus últimos onze fins de ano voando, para que vocês tenham ideia de como é.

Primeiramente, sou um privilegiado: em todos esses anos de aviação, não houve um Natal sequer que eu não tenha passado com minha família. Nem todo mundo tem essa sorte, mas eu, mesmo nos meus primeiros anos, consegui dar um jeito de ir em casa. Às vezes só para a ceia, às vezes só para o almoço do dia 25, quase sempre com algum sacrifício, mas em todas as vezes deu certo. O primeiro Natal marcou: fui acionado, levei uma prima minha no avião por coincidência de manhã de Florianópolis para o Rio de Janeiro – descobri que ela estava a bordo pois ela reconheceu minha voz no alto-falante durante o embarque! – e à noite, lá estava eu celebrando com ela, meus pais e irmãos. Como a empresa crescia rápido, logo fiquei antigo o suficiente para ganhar folga de Natal, e ficou fácil. Mas para isso, eu abria mão do Ano Novo, e é aí que a maior parte das aventuras acontece.

Nesses onze anos, em dois réveillons eu estava em treinamento em solo, portanto de folga. Mais um em que estava de licença – nos EUA, fazendo curso de piloto – sobraram oito, todos interessantes. Em 2005, o primeiro ano, não tive folga nem de Natal nem de Ano Novo. Pelo contrário, fiz reserva no dia 31 até 23h30 em Congonhas. Preso em São Paulo a meia hora da virada, passei com amigos de outra companhia no apartamento ao lado do meu, e foi ótimo. Em 2006, a mesma coisa, mas a reserva terminou antes: às 21h, em Guarulhos, e dá para dizer que foi o mais intenso de todos. Para resumir, consegui pegar a ponte aérea de 21h45, às 23h30 eu estava correndo pelas ruas de Copacabana, meia noite eu estava em Ipanema no show do Black Eyed Peas com amigos do Brasil, França e Colômbia e às oito da manhã dormia no meu apartamento em São Paulo – para voar de novo às 17h. Já 2007, eu tinha voado no Natal, mas estava de folga na virada do ano, e a ideia era assistir aos fogos em Copacabana, mas minha namorada de então foi acionada para pernoitar em Cuiabá. Quanto amor! Lá fui eu, e celebramos o Ano Novo uma hora depois – graças ao fuso-horário – na capital mais quente do Brasil. Em 2008, eu estava em treinamento para a companhia com a qual fizéramos uma fusão, e passei numa praia do litoral paulista com amigos da minha namorada. Em 2009, pedimos os dois para passar o réveillon em Buenos Aires, e fomos atendidos! Mas em voos diferentes… Deu certo, e embora o tempo junto tenha sido curto e achar um lugar para jantar tenha sido quase impossível – fomos salvos por um bife de chorizo no Cafe de La Ciudad, em frente ao Obelisco, os fogos estavam lindos em Puerto Madero, tomado de brasileiros ao mesmo tempo em que todos os argentinos pareciam estar no Brasil. Já 2010, foi o mais épico dos réveillons: um pernoite de 4 dias em Cancún, no México. A tripulação do Boeing 767 fretado se dispersou entre a praia e a espetacular ruína Maia Chichen Itzá, mas na noite do dia 31, em dois barcos, seguimos os quatro pilotos e doze comissários para Isla Mujeres. Crewlife level: hard. Já no final de 2011, foi meu primeiro Ano Novo como chefe de cabine. Recém-promovido, no final da fila, foi o único em que passei literalmente voando, vendo os fogos pela janela, a vinte minutos de pousar em Salvador. Pensando na vida lá na frente do avião todo apagado e quase vazio, os comissários do voo vieram interromper meu devaneios com abraços e um simpático espumante chamado “Guaraná”. Em 2012 eu passei de licença não-remunerada, em Daytona Beach, Florida – a praia feia mais bonita do mundo. Já 2013, de volta ao voo, também foi em Salvador, mas pousei cedo, e à meia noite, duas tripulações se juntaram no terraço do hotel, muitos acompanhados, como eu, que levei minha esposa – já então ex-comissária. Em 2014, estava em treinamento de novo, dessa vez para copiloto, e acabei passando no lugar que marcou minha adolescência: a praia de Cachoeira do Bom Jesus, em Florianópolis – isoladamente o lugar onde passei mais réveillons na vida antes da aviação. Junto com minha esposa, meu irmão e minha mãe. E por último, ano passado, passei em casa, em Floripa também, após pousar com um desafiador vento de través 40 minutos antes da virada no aeroporto da minha cidade natal.

Esse ano, o plano é mais simples: voarei do Santos Dumont, no Rio, dias 31 e primeiro. Mas com um hiato de mais de 24 horas entre a chegada de um voo e a apresentação do seguinte, tentarei fugir para Floripa. Ano que vem eu conto se deu certo. Feliz 2017 para todos nós, esse ano promete, e a contar pelos últimos onze, vai ser inesquecível.

Foto: Boraceia, litoral norte de São Paulo. Nem parece que passaram 8 anos, parece?   


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