Os mesmos erros

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“Para que cometer erros antigos se há tantos erros novos a escolher?”, perguntava o genial filósofo britânico Bertrand Russel em uma de suas frases mais famosas. A aviação é especialmente intransigente nesse aspecto. Por isso, antes que possamos pilotar um avião, estudamos tanto. Antes do solo, voamos tanto com o instrutor. Antes de podermos atuar como pilotos em comando, precisamos passar por tantos exames teóricos e práticos. Não é uma ciência cartesiana, pois lida com o clima, mas principalmente, com o ser humano. E em nós, está imputada a falibilidade. O meio, o homem e sim, a máquina, que também falha, pois é projetada, operada e mantida por homens, falhos.

E reconhecermos que podemos errar é fundamental para que erremos menos, ou com menos gravidade. São centenas de detalhes, e mesmo as operações mais simples exigem atenção constante. É natural que você não saiba ou não lembre de alguma coisa menos crítica, mas o essencial não pode faltar jamais. E ainda mais importante: não pode partir do piloto uma atitude perigosa, propositalmente. E não são apenas os pilotos ousados que tomam atitudes perigosas. Sob pressão, interna ou externamente, todos estamos sujeitos a esticar nossos próprios limites, para realizar um voo mesmo que as condições não sejam as ideais. Por vezes, sequer temos a opção: imagine-se num voo quase sem combustível após uma série de alternados fechados. Você terá que pousar mesmo sem as condições ideais, pois muito mais arriscado seria você sequer poder escolher onde cair.

Por isso, a busca da contingência é tão importante. O gerenciamento do combustível, o monitoramento das condições meteorológicas, e mesmo a burocracia. Voar com uma licença ou habilitação vencida é, além de ilegal, uma atitude burra, pois se qualquer coisa acontecer, o seguro não irá cobrir nem a você, nem aos seus parentes. E acima de tudo: o conhecimento dos seus limites e dos da aeronave. Um pai saiu com seu filho de doze anos para uma viagem que estavam esperando há meses no Piper Cherokee da família. Estava nublado, mas a camada parecia fina. Ele não tinha treinamento IFR. Em segundos, após a decolagem, o piloto não sabia mais se estava subindo ou descendo, e após uma série de piruetas dentro das nuvens, a asa se partiu e a aeronave se chocou violentamente com o chão. Um casal decolou com um Cessna 150 numa tarde quente de um aeródromo alto para viajar até a fazenda vizinha. Levavam bagagem, o tanque estava cheio, e segundos depois da decolagem estavam ambos reduzidos a carbono negro num pasto próximo da cabeceira. Um King Air estava voando entre duas cidades quando perdeu um dos motores. O piloto não conseguiu manter o controle da aeronave, que caiu na mata. Todos estes, cada um à sua maneira, acidentes que poderiam ser evitados. Com treinamento e disciplina, principalmente.

Voar é inerentemente arriscado. Dependendo de onde você vive, mais arriscado que ficar no chão. Mas cabe a todos no sistema, e em última instância, ao piloto, determinar o nível de risco que ele vai aceitar. E mesmo não decolar é uma opção. Como dizem, “mais vale um voo atrasado que um acidente no horário”.

Foto: um dia inesquecível, meu primeiro voo de instrução como piloto, em maio de 2012. Três meses depois, essa aeronave acidentou-se durante um pouso em meio a fortes rajadas de vento associados a uma tempestade de verão. Ninguém se feriu gravemente, mas a aeronave foi perdida. No relatório final, “poor weather planning”.   

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