O Governo Português vai levar a votação na Assembleia da República o plano de reestruturação da TAP, que obriga a despedimentos e cortes salariais”, escreve na noite deste domingo, dia 6 de dezembro, o jornal ECO, na sua edição online, que cita declarações do comentador Luís Marques Mendes na sua habitual intervenção semanal no canal televisivo SIC aos domingos à noite.
Se não conseguir uma votação favorável ao plano, que será apresentado antes às instâncias europeias, em Bruxelas, onde será também negociado com a Direção Geral da Concorrência da União Europeia (DGCOMP), o Executivo de Lisboa admite a liquidação da companhia, adianta o jornal, que obteve a confirmação junto de fonte governamental.
O artigo do jornal ECO, da autoria do jornalista António Costa, explica os passos que estão a ser seguidos neste processo e nos próximos dias. Um tema que, certamente, durante a corrente semana, deve estar nas primeiras páginas e nos alinhamentos dos noticiários televisivos e radiofónicos em Portugal, com intervenções das várias estruturas sindicais que defendem os trabalhadores ao serviço do Grupo TAP SGPS.
Com a devida vénia reproduzimos, em seguida, o texto, que reputamos de bastante elucidativo:
“A decisão política está tomada: O Governo quer levar ao Parlamento a votação do plano de reestruturação da TAP, que obriga ao despedimento de cerca de dois mil trabalhadores e a cortes salariais médios de 25%. A informação foi antecipada por Marques Mendes no comentário semanal na SIC e confirmada pelo ECO junto de uma fonte governamental que acompanha o dossiê. “O PS não tem maioria absoluta, não pode implementar uma coisa que custa tantos milhares de milhões de euros sem respaldo do Parlamento“, e se a oposição chumbar o plano, a TAP vai para liquidação.
O plano de reestruturação da TAP já anunciado aos sindicatos tem metas agressivas: Redução da frota para 88 aviões, despedimento de cerca de dois mil trabalhadores (pilotos, comissários e pessoal de terra) e cortar os salários em cerca de 25%, o que já mereceu uma reação agressiva dos sindicatos. O Governo tem de apresentar a reestruturação até dia 10 de dezembro em Bruxelas, mas sabe o custo político associado a um plano que já consumiu 1.200 milhões de euros, para assegurar a manutenção da TAP durante este ano, e tem orçamentada já uma garantia pública de 500 milhões de euros para o próximo ano. E por isso quer comprometer toda a oposição no destino da companhia. “Querem uma companhia aérea têm de assumir que isso custa dinheiro, não querem, liquida-se“, diz a mesma fonte governamental.
A estratégia do Governo é óbvia. Perante a mais do que provável reação sindical e política ao plano de reestruturação, e da sua difícil viabilidade, vai obrigar os partidos da oposição, e particularmente o PSD, a comprometerem-se com a solução para a TAP. “O primeiro erro foi não ter plano de reestruturação. Meteram dinheiro sem ter plano de reestruturação, às cegas, digamos assim. Agora vamos ver o plano de reestruturação, se é exequível e quanto dinheiro pode mais precisar“, afirmou Rui Rio no Parlamento no dia 27 de novembro, no âmbito da discussão do Orçamento para 2021. “Agora, vão ser todos chamados a dizer o que querem para a TAP e vão começar a pensar melhor antes de falar”, disse a fonte governamental ao ECO.
Ainda não há data para levar o dossiê TAP ao Parlamento, mas será sempre depois de negociado e aprovado pela Comissão Europeia e pela direção geral da Concorrência. “A entrega em Bruxelas é só o início de um processo de interação e negociação com a DGCOMP”, diz a fonte governamental ao ECO. Assim, para o Governo, quando o Parlamento for chamado a votar o plano, saberá que tem em cima da mesa uma reestruturação aprovada por Bruxelas, “viável e definitivo”, e não um plano eventual, que ainda poderia ser alterado por imposição comunitária.
Mesmo que haja um chumbo do plano de reestruturação no Parlamento, o Governo não vai retirar consequências políticas, isto é, não admitirá uma crise política. A consequência será mesmo a liquidação da companhia, que controla em 72,5% (o capital remanescente está nas mãos de Humberto Pedrosa e dos trabalhadores), e o Governo sabe que o Estado é um credor preferencial, o que permitirá recuperar, mesmo que parcialmente, a injeção de fundos públicos.
O Governo tem uma justificação para levar o plano de reestruturação da TAP ao Parlamento agora e não em julho, quando decidiu injetar fundos na companhia: Só agora, na posse de toda a informação, e com um plano de reestruturação elaborado, com os respetivos custos, é que faz sentido levá-lo a votação. Antes seria apenas uma tática política e ideológica, diz a fonte do Governo.
O Governo de António Costa, recorde-se, decidiu reverter o negócio de venda da TAP a David Neeleman e a Humberto Pedrosa e acabou por passar a ser o maior acionista, com 50% do capital. Passou a indicar o chairman da empresa e seis administradores não executivos. A gestão operacional ficou entregue aos privados, a compra de aviões acelerou e em 2019 começaram os contactos para a venda de uma parte do capital a outra companhia. Mas mesmo antes da pandemia, a TAP somou dois anos consecutivos de prejuízos. Só em 2019 foram mais de 100 milhões de euros.
Decreto-lei de 1977 para fazer reestruturação
Antes da entrega do plano em Bruxelas e da posterior aprovação no Parlamento, o Governo quer ter um acordo com os sindicatos (são mais de dez), mas as reações que já são públicas tornam a sua viabilidade limitada. E a TAP já tem uma estratégia jurídica, que exige o apoio do Governo, para suspender os mecanismos de regulação laboral. Segundo revelou o ‘Observador’, e o ECO confirmou, o conselho de administração da TAP, liderado por Miguel Frasquilho, admite recorrer a um decreto-lei de 1977 que define as condições das empresas em situação económica e financeira difícil, incluindo empresas públicas ou maioritariamente controladas pelo Estado.
“Podem ser declaradas em situação económica difícil empresas públicas ou privadas cuja exploração se apresente fortemente deficitária, prevendo-se que a sua recuperação seja problemática ou demorada”, refere-se no artigo 1º do referido decreto-lei. E se o Governo aceitar a proposta da empresa, neste caso a TAP, o artigo 5º do diploma admite “a redução das condições de trabalho vigentes na empresa aos mínimos fixados nos instrumentos de regulamentação coletiva”, “a não aplicação, total ou parcial, das cláusulas dos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho e o estabelecimento do respetivo regime sucedâneo” e “a suspensão de contratos individuais de trabalho”.”
- Foto © João Chaves