O ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Augusto Santos Silva, disse nesta terça-feira, dia 29 de junho, que o modelo definido na Europa para o certificado digital que permite viagens na região será aplicado a países terceiros, respondendo às preocupações da União Africana (UA).
“O passo seguinte [face ao regulamento que entrará em vigor na quinta-feira, dia 1 de julho] é utilizar os princípios deste modelo para as negociações com países terceiros no que diz respeito ao reconhecimento recíproco de vacinações”, respondeu o governante à agência de notícias ‘Lusa’, quando questionado sobre as preocupações da UA por a vacina produzida na Índia sob licença da AstraZeneca, a mais usada em África, ter ficado de fora do certificado digital.
Santos Silva falava durante a conferência de imprensa que encerrou a 11ª reunião ministerial entre a União Europeia e Cabo Verde, esta tarde em Lisboa, que foi promovida pela presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (UE). No encontro, em formato híbrido, o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros representou o alto representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Josep Borrell.
“O certificado digital é um regulamento da União Europeia, com aplicação direta na UE e regras que se destinam a facilitar a circulação interna no Espaço Schengen, e a vacina é uma das três condições possibilitantes dessa facilitação à circulação, juntamente com a imunização ou teste negativo”, explicou o governante português.
Segundo Santos Silva, “relativamente à vacinação, o que está previsto é a vacinação completa, com uma ou duas doses, consoante o caso, realizada pelo menos 14 dias antes da viagem e de uma das vacinas aprovadas pela Agência Europeia do Medicamento”.
“O passo seguinte é utilizar os princípios deste modelo para as negociações com países terceiros no que diz respeito ao reconhecimento recíproco de vacinações, e é isso que a Comissão Europeia já está a fazer, designadamente com os Estados Unidos e a Suíça, e é isso que faremos com outros países”, apontou o governante, quando questionado sobre o facto de a vacina Covishield, produzida na Índia sob licença da AstraZeneca, ficar de fora deste processo.
Portugal, concluiu, “aplicará escrupulosamente o certificado digital no quadro da circulação interna da UE e utilizará os princípios desse certificado no reconhecimento recíproco de vacinações com países terceiros”.
A Comissão da União Africana e o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças (África CDC) da organização mostraram-se preocupados com a aplicabilidade do certificado digital da União Europeia, temendo a não inclusão das vacinas inoculadas em África.
Num comunicado partilhado no portal do África CDC na segunda-feira, os dois organismos dizem que “registaram com preocupação as recentes comunicações sobre a aplicabilidade do certificado digital da EU [União Europeia]” perante as diferentes vacinas contra a covid-19.
No documento, saúdam o certificado e “o seu potencial para facilitar significativamente a livre circulação segura em todos os Estados-membros da UE e em certos países associados”, que apelidam de “um passo significativo”.
“Contudo, as atuais diretrizes de aplicabilidade põem em risco o tratamento equitativo das pessoas que receberam as suas vacinas em países que beneficiam do mecanismo Covax, apoiado pela UE, incluindo a maioria dos Estados-membros da UA [União Africana]”, alertaram os dois órgãos regionais.
Na quinta-feira passada, Portugal aprovou o decreto-lei que regulamenta o certificado digital covid-19 da UE, comprovativo da testagem negativa, vacinação ou recuperação da doença, que entrará em vigor nos 27 Estados-membros a tempo do verão e que poderá ser usado para viagens.
O passaporte contempla apenas as vacinas aprovadas pela EMA (Agência Europeia de Medicamentos): Pfizer/BioNTech, Moderna, AstraZeneca e Janssen.
Citando documentos da Comissão Europeia, as organizações regionais africanas argumentam que a vacina Covishield, produzida pelo ‘Serum Institute of India’ (SII), maior fabricante de vacinas do mundo, com a licença da AstraZeneca, está excluída deste certificado digital.
“Estes desenvolvimentos são preocupantes, dado que a vacina Covishield tem sido a espinha dorsal das contribuições da Covax, apoiada pela UE para os programas de vacinação dos Estados-membros da UA. Além disso, dado que o objetivo expresso para a produção do ‘Serum Institute of India’ é servir a Índia e países de menores rendimentos, o SII pode não solicitar uma autorização de comercialização a nível da UE, o que significa desigualdades no acesso aos ‘passes verdes’ criados”, alertaram.
Nesse sentido, a Comissão da UA e o África CDC instaram a Comissão da UE a “considerar o aumento do acesso” no caso da vacinação realizada com recurso às vacinas “consideradas adequadas para o lançamento global através do mecanismo Covax”.