A viúva de Marcos Martins, piloto morto no acidente que também vitimou, há quase um ano, o candidato à presidência do Brasil, Eduardo Campos, elaborou e enviou uma carta para o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) e para a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) do Brasil. Com a ajuda de consultores, Flávia Martins alega que as aeronaves da família Cessna 560 Citation EXCEL (XL, XLS, XLS +) apresentam uma falha nos estabilizadores horizontais.
Neste modelo de avião, se a velocidade estiver acima de 200 nós (cerca de 400 km/h) e os flaps são recolhidos e o estabilizador horizontal provoca uma tendência do nariz para baixo. No momento do acidente, o avião estava em aceleração e com um ângulo de 38º em relação ao solo, segundo o Cenipa. O centro assegurou que os apontamentos das famílias dos pilotos serão levados em consideração, mas uma nota oficial sobre a investigação deverá ser divulgada ainda esta semana. A queda do avião com a matrícula PR-AFA, em Santos, São Paulo, vitimou sete pessoas. Foi na manhã do dia 13 de agosto de 2014. Além do candidato à presidência, Eduardo Campos, os pilotos Marcos Martins e o copiloto Geraldo Magela, os fotógrafos Alexandre Severo e Macelo Lyra, o jornalista Carlos Percol e o assessor Pedro Valadares, também morreram.
Na última conferência de imprensa, no dia 26 de Janeiro deste ano, o Cenipa revelou que os pilotos aceleraram o avião em direcção ao solo. Segundo o tenente-coronel Raul de Souza, o piloto fez um trajecto “diferente” do previsto no plano de voo. “Não podemos concluir que ele tenha feito um atalho. Ele fez um procedimento diferente do que estava previsto”, afirmou, na época. Os responsáveis pela análise, porém, disseram que ainda não era possível concluir se esse factor contribuiu para o acidente, nem se houve erro dos pilotos. Também disseram que não foi identificada falha técnica da aeronave.
Carlos Camacho, especialista em acidentes aéreos e piloto há 38 anos, foi quem levantou para as famílias dos pilotos a tese de uma falha de previsão no projecto do avião. Dois outros casos foram detalhados no documento encaminhado ao Cenipa: um incidente aéreo que ocorreu em 2 de Dezembro de 2002, na Suíça (avião com a matrícula HB-VAA); e outro mais recente, num avião que voava de Manaus para Orlando (matrícula PP-MDB). De acordo com a tese das famílias, esses dois incidentes e o acidente de Eduardo Campos tiveram a mesma causa. “Eventos que, de uma ou de outra forma, se correlacionam e apontam o estabilizador horizontal como o verdadeiro ‘vilão’”, como está escrito na carta encaminhada às autoridades de investigação.
Sem qualquer relação com a família dos pilotos, o professor de Aerodinâmica da Escola Politécnica, Júlio Romano Meneghini, foi um dos profissionais que analisaram os vídeos do acidente, há um ano. Hoje, “não descarta a hipótese recentemente apresentada” e confirma tal fenómeno apontado pelos parentes dos pilotos como característica dessa família de aeronaves Cessna. Camacho, consultor da família dos pilotos, argumenta que essa falha de previsão dos modelos seria recorrente, utilizando os dois casos anteriores. Esta é a principal tese que deverá ser apresentada pelos advogados das famílias dos pilotos Marcos Martins e Geraldo Magela, segundo o advogado que as representa, Josmeyr Oliveira.
De facto, existe um alerta sobre a combinação velocidade/flaps/estabilizador horizontal no manual dos aviões desta família. O aviso diz, em livre tradução: “caso ocorra uma falha do sensor de velocidade, ao se comandar o recolhimento dos flaps e estando a velocidade acima de 200 nós ou cerca de 400 km/h, poderá ocorrer a movimentação de nariz para baixo de forma intensa. A tripulação não terá qualquer forma de controlo no posicionamento do estabilizador horizontal. O movimento do estabilizador só é controlado pela posição da alavanca de accionamento dos flaps do avião, quando a mesma é levada para a posição zero grau (up)”.